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sexta-feira, 8 de outubro de 2010

PSICOLOGIA PARA LEIGOS - ANSIEDADE, O MAL DESTE SÉCULO (I).

A primeira dificuldade com que você vai-se deparar é com a definição do que seja ansiedade. Como tudo o que diz respeito ao ser humano, aqui também há ambigüidade, discordâncias e variações complexas. Em 1884 homens de ciência e filósofos proeminentes, cujos nomes não se apagarão dos anais da História humana, criaram um modo de ver e interpretar a pessoa no seu viver no mundo que foi chamada de Existencialismo. Entre aqueles homens vou citar um de nome estranho: Søren Aabye Kierkegaard - foto ao lado (nascido em Copenhague, 5 de maio de 1813 — falecido em Copenhague, 11 de novembro de 1855) foi um filósofo e teólogo dinamarquês - daí seu nome estranho para nós, brasileiros. Como todo gênio, suas idéias continuaram pelos séculos adiante, sempre marcando e criando escolas no pensamento humano. Ele e Martin Heiddeger (foto abaixo da de Kierkegaard) criaram suas escolas ou sistemas filosóficos a partir de suas argutas observações do que chamaram de alheamento do homem em relação a si mesmo. Em que consistia este alheamento? Em algo extremamente importante para qualquer pessoa - inclusive para você que me lê - a excessiva ritualização da Sociedade, com ausência de sentido dos objetivos da pessoa e a conseqüente perda do espírito interior, além do desvanecimento da criatividade. Uma vez que era religioso, Kierkegaard compreendia a alienação humana como uma relação incorreta do homem com seu Deus. Heiddeger, entretanto, mais cético, interpretou a alienação humana como uma quebra da Moralidade Básica na qual o homem cuidava de seu irmão (não irmão de sangue, mas irmão de espécie). Por isto, Kierkegaard compreendia a ansiedade como uma "ambiguidade psicológica" e dizia que se podia comparar a angústia (ansiedade exacerbada) à vertigem. Foi dele esta imagem, para explicar como entendia o processo da angústia: "quando o olhar de uma pessoa mergulha num abismo ela sente vertigem; uma vertigem que  tanto lhe vem do olhar quanto do abismo em si, pois que lhe seria impossível deixar de o encarar, já que está diante de si". Quem nunca sentiu vertigem diante de um abismo? O beiral de um edifício; a sacada de um apartamento no alto de um prédio; a margem pedregosa de um precipício na mata ou à beira da estrada... Enfim, em todas estas situações, qualquer pessoa não somente sente um impulso para olhar para baixo, como sente a reação de vertigem - tontura, sudorese, boca seca, perda do senso de equilíbrio, medo etc...


Sigmund Freud, em 1920, definia  a ansiedade como uma reação do ego ao perigo e como sinal preparatório para a fuga. Ora, todo animal, diante do perigo, entra em alerta. Seu coração dispara; suas pupilas se dilatam; seu sistema nervoso fica sensível com descargas de adrenalina... Enfim, todo o seu corpo se prepara para a fuga à percepção de perigo. Na versão psicanalítica, o indivíduo que sofre de Transtorno de Ansiedade (antiga Neurose de Ansiedade) tem reações orgânicas características desta reação hormonal, neurológica e comportamental sem, contudo, haver uma causa externa real. Subitamente seu coração dispara; sua boca fica seca; seus pés e mãos gelam; sente-se tonto; o raciocínio torna-se confuso; o corpo fica trêmulo e a respiração ofegante. Estes são sintomas clássicos de uma reação de ansiedade. É de se notar que com maior ou menor intensidade, as pessoas atualmente vivem sofrendo destes sintomas, quer o estímulo que o desencadeie seja real (a iminência do início de uma prova, por exemplo), quer seja fruto da imaginação (o receio de receber um "não" a um pedido; ou a fantasia da existência de perigo em determinado lugar ou em determinada autoridade).
Estes e Skinner, dois psicólogos modernos, defensores da escola comportamentalista, afirmavam que a ansiedade é resultante da associação entre dois estímulos ambientes. Um destes estímulos deve ser neutro e o outro potencialmente ansiogênico. Por exemplo. Um ursinho de pelúcia (estímulo potencialmente não ansiogênico) e uma barra de ferro (estímulo potencialmente ansiogênico). Pode-se condicionar uma criança a temer o ursinho de pelúcia, ao qual reagia com alegria e simpatia, levando-a a reagir a ele com medo e choro. Basta que, sem que a criança perceba, quando ela estender as mãos para o ursinho, alguém martele com força a barra de ferro. O súbito som emitido pela barra assusta a criança. Repetindo esta martelada toda vez que a criança estender os braços para o ursinho, ela passará a ter medo dele e quando o vir novamente, reagirá com ansiedade e choro, buscando afastar-se do ursinho porque o vê como algo aterrorizante, mesmo que não ocorra mais o som ansiogênico da barra de ferro sendo martelada. Então, o estímulo ursinho, inicialmente neutro, torna-se um estímulo ansiogênico.
Bom, o leitor poderá verificar que em sua vida com muita freqüência dezenas de "ursinhos de pelúcia" se tornaram para si estímulo altamente ansiogênicos. Basta que pare para refletir nos seus objetos de medo social. Uma autoridade (um policial, por exemplo); um determinado alimento; uma determinada condução; uma determinada situação em que tenha de falar em público... Enfim, o próprio leitor poderá sair de si e se observar de longe para descobrir muitos "ursinhos de pelúcia" que, agora, o colocam em situação de alta ansiedade.
Enry Ey, psiquiatra e psicanalista francês, define ansiedade mais ou menos como Freud, porém diz que ela é anacrônica, no sentido de que faz reviver situações passadas e deixadas para trás; é fantasmática por ser engendrada não por uma situação real do Eu que percebe o mundo aqui-e-agora, mas pela representação imaginária de um conflito inconsciente. É "estereotipada" ou repetitiva, isto é, está enraizada no próprio caráter do indivíduo". Embora mais sofisticada, esta definição não está longe da realidade do cidadão civilizado de nossos dias. Ela diz respeito a vivências pretéritas que foram profundamente ansiogênicas ao sujeito que as viveu, mas não conseguiu resolvê-las a contento. O resultado foi que seu Eu ficou aprisionado àquela situação não resolvida e toda vez que um ambiente se estrutura de tal modo a fazer que o indivíduo associe, ainda que de modo subliminar, os quadros presentes àqueles pretéritos, a mesma reação de ansiedade é eliciada, isto é, estimulada e ele se comporta para com a situação atual como se estivesse diante da situação passada. Ora, ainda que seja mais trabalhoso, pois muitas das situações ansiogênicas passadas já foram "esquecidas" por você, é-lhe possível fazer um esforço e "desentocar" velhas lembranças que estão no sótão do esquecimento e verificar que ela tem todos os quadros que estão estruturando o novo ambiente de sua vida, ou, pelo menos, a maior parte daqueles quadros que lhe foram extremamente incômodos, ansiogênicos. Esta rememorização já será meio caminho andado para que você se livre de seu Transtorno de Ansiedade.
Lazarus, outro psicólogo que fez escola nas décadas 60-80, sustenta que "a ansiedade é a resposta do organismo a uma ameaça percebida" e prossegue afirmando que "é enganoso afirmar que a ansiedade motiva o comportamento. De fato, se ela atua como um sinal, não motiva, em sentido estrito, o comportamento. É a ameaça que o motiva".
Lazarus nos leva à profunda questão da gestalt (palavra alemã adotada como paradigma para exprimir o "fechamento" de uma percepção). Para melhor entender isto, veja-se a figura ambígua clássica nos livros de Psicologia dos anos 60 a 90, ao lado. Nela, você tanto pode ver a figura de uma jovem quanto a figura de uma velha. Quando você enxerga a velha, perde de vista a jovem e vice-versa. Isto é fechar a gestalt de uma velha. Com muita freqüência, em nosso dia-a-dia, deparamos-nos com situações que nos são profundamente ambíguas e tendemos a percebê-la, fechando uma gestalt, de modo desfavorável e ameaçadora, o que não aconteceria a outra pessoa no mesmo ambiente. É justamente esta gestalt, esta forma percebida pelo indivíduo que elicia a reação de ansiedade no percebedor. E esta ansiedade é realmente uma resposta do organismo à ameaça percebida - e isto independende de ser ou não verdadeira a ameaça percebida pelo indivíduo na estruturação ambiental onde se encontra. Estas gestalts ansiogências têm relação com aqueles conflitos não resolvidos que a Identidade do indivíduo possui em sua estrutura.
Até aqui, acredito eu, o leitor já deve estar interessado neste assunto que, com toda a certeza, identifica como um processo poderoso em seu íntimo. Mas prosseguirei explorando este tema no próximo artigo, pois desejo que o leitor tenha tempo de absorver as informações acima, pensar sobre elas e ampliá-las com suas considerações pessoais que deverão ser tecidas ou criadas a partir de eventos passíveis de serem enquadrados nas considerações acima. Até, lá, então.

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