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sexta-feira, 11 de março de 2011

FIM DOS TEMPOS?


Japão sofre tsuname já no início de 2011
 Olho a TV com decepção para comigo mesmo. Vejo as imagens da onda gigantesca que varre o Japão sem me sentir penalizado. Aliás, sem qualquer emoção. É como se estivesse assistindo a uma cena falsa, cinematográfica. No entanto, ali são vidas em agonia. É um país sendo atingido violentamente pela Natureza. Carros, residências, indústrias, usinas, tudo arrastado como se fosse feito de palito de fósforo. Vejo tanques de combustível boiando em chamas sendo levados pelas águas tangidas por um tremor de terra no fundo do mar. Parece que alguma coisa macabra, infernal, passeia olhando satisfeita os estragos que a onda vai causando por onde passa. Campos cuidadosamente cultivados, geometricamente trabalhados, são arrasados em segundos. Lama negra vai levando de embrulhada lanchas e iates; lança navios contra pontes; emborca navios de guerra; derruba tudo como se toda a obra humana não fosse feita senão de fracas folhas de papel. O povo, sem fôlego, dentro dos prédios, corre desorientado enquanto tudo treme e cai. Os tetos de gesso desabam. Os computadores são lançados aos pisos. As meses tremem violentamente. As pessoas saem de casa para cair apavoradas, na rua, onde tudo treme. De onde virá a morte?

Fotos como esta, de cidades brasileiras afogadas quando as chuvas fazem que o leito dos rios suba de modo repentino está-se tornando calamidade anual pelo país todo. Nosso país continental tem as mesmas cenas de norte a sul e de leste a oeste. Isto sim é que é democracia. Tudo é igual para todos. Ao menos no ver da Mãe Natureza.

No Japão, o povo educado, não joga lixo nas ruas. Por lá, dá gosto se andar pelas ruas das cidades. Tudo tão limpo que nos causa a impressão de que a rua foi esterilizada. Não adiantou nada. A Natureza tratou de emporcalhar tudo, arrastando lama negra e pedaços de casas, lixo de toda a espécie e tudo misturando com a limpeza. E o fogo passeia fiscalizando o tétrico trabalho das águas do mar.

No Brasil a história é outra. As enchentes nas cidades contam com o trabalho cuidadoso dos cidadãos desleixados, irresponsáveis. Da criança aos pais; dos jovens aos idosos, todos trabalham com afinco para entupir bueiros e bocas de lobo, lançando nas ruas toneladas de lixo de toda a espécie, até aquele lixo hospitalar perigosíssimo. Os governos, à parte a ladroeira que é endêmica entre os políticos, se esforçam para minimizar os desastres. Inutilmente. A má-educação brasileira vem desde há 511 anos. Somos emporcalhadores de berço. Transmitimos aos nossos rebentos a cultura da imundície, do desrespeito ao bem público (digamos bem comum, pois esta coisa de "público" arrepia as medulas dos poucos que têm consciência cívica no país). Sacolas plásticas, garrafas pet, papelão, poltronas velhas, pneus usados, restos de comida e tudo o que se pode, joga-se nas ruas, nos rios, nos bueiros, nas bocas de lobos sem qualquer consciência do mal que se causa à comunidade. Mas é que o brasileiro ainda não tem consciência de vida comunitária. Quando muito, sua comunidade cinge-se aos limites das paredes de sua casa. Tudo o mais que se encontre além deles não merece nem atenção nem respeito por parte do brasileiro de modo geral. O alarma contra ladrão dispara na casa do vizinho? Os brasileiros se irritam e se limitam a xingar vizinho e o maldito alarma. Quase ninguém se abala a verificar a causa do disparo. Invasores de residência nem dão atenção ao alarma, pois sabem que nem a polícia nem os vizinhos virão incomodá-los no afanoso trabalho de surripiar o que o outro adquiriu às vezes com muito sacrifício. Falação política não adianta. É pura demagogia. Veja-se o seguinte exemplo: em Goiânia, esta semana, um vereador consegue aprovar uma lei que obriga as escolas públicas de primeiro e segundo graus a colocar 40 alunos em cada sala. Quarenta alunos para um só professor! Dá para imaginar a qualidade do ensino que se implanta com esta medida idiota? Mas o vereador está satisfeito. Conseguiu levantar uma polêmica entre osseus pares, o que certamente vai assegurar por meses, talvez por mais de ano, o emprego de todos eles. E tem mais: o tal boolling importado dos EUA e ao qual os alunos brasileiros aderiram com ardor, em salas de aula com quarenta aficcionados da violência gratuita coloca a vida dos professores em grande perigo. Alunos brasileiros já entram nas salas de aula portando revólveres trintoitão, quando não levam pistolas. Os menos aquinhoados vão de peixeira mesmo; por que não? Geralmente praticam artes marciais e para descer o braço numa professora, mãe de família, que se esforça para que eles aprendam alguma coisa que os faça mais humanos, não hesitam nem um pouco. Mas o senhor Vereador Goiano não levou isto em consideração. Aprovou sua lei. Fez seu trabalho: legislar a torto e a direito. Agora, que se danem os professores e seus alunos animalizados porque as famílias brasileiras, cada vez mais desestruturadas, não tem condição de humanizar os animaizinhos que colocam no mundo.

O ser humano não pode viver separado do lixo que produz. Ele e a vida de cada um de nós tem profunda ligação e como um demônio maldoso, o lixo ri um riso perverso, pois sabe que sem consciência desta ligação íntima entre nós e ele, candidatamos-nos a ser vítimas de sua ação terrível...

Tudo isto e muito mais me faz ficar apático, indiferente, distante da realidade. E ao final deste artigo sinto mais dó de mim mesmo do que dos que vejo agoniados pelas catástrofes ambientais. Minha catástrofe particular, solitária, tal e qual a de tantos outros, eu sofro sozinho. Vejo minha alma se tornar endurecida e até mesmo dizendo maldosa: "eles merecem!". Mas eles também sou eu. Sei disto intelectualmente, mas não o sei mais emocionalmente. Que pena...

2 comentários:

  1. Muito real e didático texto. Parabéns pela brilhante iniciativa.

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  2. Fico surpreso ao ver um jovem tão jovem ler e compreender o que escrevo. Parabéns a você, que me mostra que a juventude ainda tem salvação. E obrigado pelo elogio. Valeu mesmo. Orisval

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